quinta-feira, 17 de junho de 2021

Empoderamento feminino é um ato político e o capitalismo te engana todos os dias

  

Por Mani Ceiba

Faz algum tempo que esse termo estava me incomodando. Mas eu não sabia dizer exatamente porque e até me sentia mal por estar me incomodando com um termo de pautas feministas. Até ler e ouvir Joice Berth. Foi quando os cubinhos se encaixaram e eu entendi exatamente o que me incomodava e o porquê. E quero muito falar sobre isso. 

Na fala de bell holks, trazida por Djamila Ribeiro em entrevista na Carta Capital - bell holks é escrito em minúsculo a pedido dela -, “ o empoderamento diz respeito a mudanças sociais numa perspectiva antirracista, antielitista e antissexista por meio das mudanças das instituições sociais e consciência individuais. É necessário criar estratégias de empoderamento no cotidiano, em nossas experiências habituais no sentido de reivindicar nosso direito à humanidade.” Ou seja, não existe empoderamento se ele não incluir as pessoas ou grupos que sofrem a opressão.

Empoderamento não é uma causa isolada. Não é você usar batom vermelho, decote, penteado do super style de cabelos e salto alto, tirar foto no Instagram com a hastag empoderada. Empoderamento feminino é comprometimento com todas as mulheres poderem se sentir bem com ou sem batom, com seu cabelo preso com um coque do dia-a-dia ou ainda nem ter cabelo. Não são nossas escolhas individuais e sim escolhas que sejam pela coletividade, pelo fortalecimento de uma sociedade mais justa para todas. É perceber que uma conquista individual nossa não pode estar separada de conquistas de todas, e saber exatamente seu lugar dentro da sociedade e como pode interferir nas políticas sociais das classes que você representa ou pode representar.

Joice Berth questiona a "ideia liberal de meritocracia". Segundo ela, “quando as conquistas são relacionadas a benefícios individuais, não se trata de empoderamento, embora seja essa a ideia mais disseminada relacionada com o termo”.  

- Se ele não é revertido para o grupo minoritário em que você está inserida, então você não está trabalhando exatamente o conceito de empoderamento - afirma Joice em entrevista à jornalista Cris Rodrigues.

O empoderamento feminino é a consciência coletiva e não conquistas individuais, expressada por ações para fortalecer o posicionamento das mulheres em busca dessa igualdade de gêneros. E o feminismo não pode ser considerado de uma maneira única e universal, temos o empoderamento lgbt, de mulheres negras, mulheres indígenas e outros não ligados somente aos feminismos.

Em outras palavras, quando usamos uma roupa de marca, resolvemos usar batom rosa choque e nos sentimos bonita e poderosa, não estamos praticando o empoderamento feminino. Apesar da autoestima, o poder de escolha de como queremos nos vestir serem conquistas nossas, o empoderamento está quando essa conquista abrange além de nós mesmas. E é exatamente nessa distorção de valores que o capitalismo passou a usar o empoderamento como ferramenta, como na fala da “Furiosa no QG Feminista: “o capitalismo utiliza o termo empoderamento como sinônimo de fortalecimento da autoestima, sinônimo de autoafirmação, de abraçar a própria identidade independentemente — eis a questão — das opressões envolvidas na própria construção desses fatores.” 

O capitalismo se apropriou da ideia, inverteu o significado e nos vende a ideia de volta todo dia, e pior, a gente compra sem questionar!

Por exemplo, quando uma marca usa o empoderamento feminino ou de raça para fazer propaganda de um cosmético, de maquiagem ou de roupa. Sendo que não é toda mulher que teria acesso a esse produto. E não se levando em consideração o quanto essa mesma indústria usa o fato de como uma mulher deve ser para ser aceita socialmente por uma sociedade patriarcal, isso não é empoderamento!

A conscientização da realidade é um ato político. 

Enxergar como nos empurram para buscar os padrões estéticos, tentam nos manter frágeis em roupas que mal nos movimentamos, nos fazem equilibrar em saltos, nos fazem ser depiladas todo tempo e usar perfumes vaginais é mais que necessário. E ainda ter claro que as escolhas que fazemos são nossas mesmas e não buscas de aprovação, é autoconhecimento e um ato político.

Quem é que ganha quando nos deixamos vencer pelo individualismo e nos enganamos acreditando que o poder é usar o que o patriarcado sempre nos empurrou goela abaixo? Nosso ideal e a nossa liberdade?

É só pensar em quem ganha vendendo maquiagem, produtos de beleza, roupas de marcas famosas? 

 O capitalismo não vende só produtos, vende ideias. O neoliberalismo sabe o quanto o real empoderamento colocaria em risco seu poder e usa os termos da moda, ganhando assim elogios de grupos que deveriam ser justos e anticapitalistas.


“O poder só existe de maneira justa quando é coletivo" – Joice Berth 

Referências :

Paulo Freire-Medo e ousadia: o cotidiano do professor (1986)/ Djamila Ribeiro. O que é empoderamento feminino? Carta Capital/ Joice Berth – Empoderamento (2017)/QGfeminista 


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